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3 perguntas a...

João Manso Neto

Presidente Executivo da Greenvolt

10.02.2023

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  1. A implantação das energias renováveis, em especial a solar, está a mudar a paisagem portuguesa. Todos vemos enormes áreas do território ocupadas por centrais solares e parques eólicos, o que levanta vários problemas sobre o uso do solo, nomeadamente conflitos com o impacto na paisagem, com o património arqueológico ou mesmo com o setor agrícola. Como é possível manter este equilíbrio entre ambiente e negócio?

É impossível continuarmos a consumir combustíveis fósseis como consumíamos, tanto pelo impacto negativo que estes têm no meio ambiente, como pela escassez desses, que se traduz em preços cada vez mais elevados, bem como pela posição de dependência que deixa os países onde pura e simplesmente não existem esses recursos.

Todos percebemos, atualmente, que o futuro da energia passa, invariavelmente, pelas energias renováveis. Dentro destas, falo da energia obtida através da biomassa, nomeadamente da residual, através do vento, tanto das eólicas onshore como offshore, ou do sol, com recurso a painéis solares fotovoltaicos, seja ele em grande escala ou através de geração distribuída.

No desenvolvimento destes projetos é muito importante não a maximização da produção de energia, mas um equilíbrio com a biodiversidade, património histórico, além de questões sociológicas. Na conceção destes projetos, é importante que se tenha em conta o equilíbrio entre eficiência económica e impacto sociológico. E aí, muito provavelmente chegaremos à conclusão de que, ainda que haja sempre espaço para projetos de grande dimensão, devemos privilegiar os projetos de produção de energia de forma descentralizada. Procurar a utilização daquilo que já está humanizado para utilizar renováveis, apostando em projetos mais pequenos inseridos dentro do ambiente e das comunidades.

 

  1. A aposta na produção de energias renováveis deve ser feita com grandes investimentos ou, pelo contrário, centrar-se na produção descentralizada, como o autoconsumo e as comunidades de energia?

Como referi, há e haverá sempre espaço para projetos de geração de energia solar de grandes dimensões, desde que nestes se consiga garantir a sua boa ligação à rede, o que nem sempre se consegue garantir. Temos cada vez maiores consumidores de energia a quererem fazer a transição energética, passando a utilizar energia renovável, pelo que serão necessários alguns desses grandes projetos.

Mas os projetos de menores dimensões têm muitas vantagens. Se, em vez de intervirmos na paisagem, utilizarmos apenas aquilo que, hoje em dia, já está humanizado, conseguiremos mais rapidamente obter benefícios para todos. É relativamente consensual que um telhado de um armazém seja equipado com painéis solares, permitindo o autoconsumo de energia renovável por parte das empresas, ou mesmo que um qualquer edifício residencial faça o mesmo, passando a gerar parte da energia que necessita. Isto traz benefícios em termos ambientais, mas também uma poupança relevante na fatura energética.

A geração distribuída de energia é extremamente importante neste processo de transição energética. Com os painéis solares fotovoltaicos temos soluções para autoconsumo, mas também vemos um crescimento acentuado nas comunidades de energia que, na prática, permitem a quem gera mais energia do que a que consome, partilhá-la com os restantes consumidores num raio até quatro quilómetros. É uma solução em que ganha quem produz, quem consome e, como um todo, a sociedade.

 

  1. Até que ponto as Comunidades de Energia podem contribuir para a produção descentralizada de energia? Que percentagem poderão ter num futuro próximo no mix energético?

A geração distribuída de energia tem um potencial imenso. A Comissão pretende aumentar a meta da UE para 2030 em matéria de energias renováveis dos atuais 40% para 45%, sendo forte a aposta na geração distribuída de energia para alcançar esse objetivo.

A razão da aposta na geração distribuída explica-se por ser a forma mais eficaz de chegarmos a esse objetivo. É de relativamente rápida implementação porque, mais uma vez, utilizamos espaço que já está humanizado, mas também porque temos a produção muito próxima do local de consumo, evitando-se problemas como a falta de conexão à rede ou as perdas de energia decorrentes do transporte dessa energia.

Além do autoconsumo, as comunidades de energia terão, sem dúvida, um papel fundamental para que rapidamente se assista à disseminação de energia renovável obtida a partir da irradiação solar. No RePower EU, a Comissão Europeia diz que podem vir a representar até 25% do consumo de eletricidade, o que é revelador da importância que poderão assumir, embora seja importante, para que tal aconteça, que sejam ultrapassados problemas de licenciamento que, em Portugal, estão a atrasar esta mudança.

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Sobre o entrevistado

João Manso Neto é um reconhecido gestor do setor energético. Em 2021 assumiu a presidência executiva da Greenvolt, empresa de energia que atua em três diferentes segmentos: biomassa, vento & energia solar em escala de utilidade e geração distribuída.

Licenciado em Economia pelo Instituto Superior de Economia, com pós-graduação em Economia Europeia pela Universidade Católica Portuguesa, João Manso Neto está no setor energético desde 2003, depois de ter passado 21 anos na Banca, nomeadamente no BCP em Portugal e na Polónia.

Antes de assumir a presidência da Greenvolt, João Manso Neto foi membro do Conselho de Administração do Grupo EDP entre 2006 e 2021 e CEO da EDP Renováveis ​​de 2012 a 2021.

A ADENE é a agência nacional para a energia, com uma missão centrada nas pessoas e a ambição de reforçar o posicionamento de Portugal na descarbonização, é um parceiro ativo da transição energética, fortalecendo parcerias, dinamizando a política pública e estando mais próximo dos cidadãos. Com toda a energia!

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