Portugal pretende promover uma transição energética justa, democrática e coesa e que caminhe lado a lado com a erradicação da pobreza energética até 2050. Estes dois propósitos encontram-se ligados e são essenciais para assegurar o compromisso assumido por Portugal de atingir a neutralidade carbónica até 2050. portantes para atingir tal propósito, o primeiro é colocar os cidadãos no centro da equação, de uma forma ativa e o segundo prende-se com a transformação do modelo atual de produção e consumo de energia.
A Estratégia Nacional de Combate à Pobreza Energética 2023 – 2050 (ELPPE), desenvolvida em linha com o Plano Nacional Energia e Clima 2030, indica que entre 1,8 e 3 milhões de pessoas em Portugal se encontram em situação de pobreza energética. Refere ainda que em 2020 a literacia energética dos consumidores particulares era de 43,8 pontos em 100. Além disso, indica que o consumo de energia satisfeito por produção local de energia renovável em 2021 era de 6,6 %. Se, por um lado, é urgente combater a pobreza energética e tornar as habitações energeticamente mais eficientes, por outro, é essencial dotar os cidadãos de ferramentas que lhes permitam aumentar a sua literacia energética, de forma a tomarem decisões informadas e conscientes no que diz respeito à forma como consomem energia.
As Comunidades de Energia Renovável (CER) e os Autoconsumos Coletivos (ACC), além de surgirem como uma fonte de energia limpa, renovável e produzida localmente, são instrumentos eficazes para atuar nas duas vertentes acima indicadas, combater a pobreza energética e promover a literacia dos cidadãos.
A ELPPE, tal como o Plano de Ação para o Combate à Pobreza Energética 2025 – 2030 (PACPE 2025-2030), atualmente em fase de revisão, identifica as CER e os ACC como peças fundamentais no puzzle a construir para atingir os objetivos propostos, apontando, inclusive, Instrumentos de Ação específicos para a sua promoção. Entre outros Instrumentos de Ação, o PACPE 2025-2030 prevê apoios financeiros para a concretização de CER e ACC, a criação de modelos de contratação pública para apoiar as entidades locais na implementação e aprovação de CER, bem como a capacitação dos municípios, fomentando a disseminação de projetos locais de CER e ACC.
Um bom exemplo é o da ilha da Culatra, onde, em 2022, foi promovida a criação de uma CER com o propósito de criar um piloto que permitisse testar a viabilidade técnica e económica destes modelos na transição energética e no desenvolvimento das comunidades. Este projeto, desenvolvido em colaboração com a Universidade do Algarve, autoridades locais e associações de moradores, visa não só a produção de energia limpa a partir de fontes renováveis, mas também o desenvolvimento económico da comunidade e o envolvimento direto da população nas decisões relativas à gestão e partilha da energia produzida, aumentando a literacia energética. Este projeto vem demonstrar como as CER podem ser ferramentas eficazes no combate à pobreza energética e promotoras de uma transição mais participativa, sendo um exemplo replicável em outras regiões vulneráveis.
A erradicação da pobreza energética e a transição energética justa e participativa não são caminhos paralelos, mas sim partes de um mesmo percurso. Através da capacitação dos cidadãos, e da promoção de modelos descentralizados e colaborativos, como as CER e ACC, é possível criar soluções que respondam a desafios ambientais, sociais e económicos. O exemplo da ilha da Culatra demonstra que, com vontade política local, envolvimento comunitário e apoio técnico, é possível desenvolver projetos inovadores que reduzem desigualdades e contribuem para a transição energética. A promoção de projetos de CER e ACC representa não só uma resposta aos compromissos assumidos por Portugal de atingir a neutralidade carbónica, mas também, com a justiça social e a coesão territorial.
Referências
Comunidade de Energia Renovável da Ilha da Culatra. (2022). Culatra 2030 – Comunidade de Energia Sustentável. https://culatra2030.pt
Observatório Nacional da Pobreza Energética. (2024). https://onpe.pt/