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Transição Energética: entre a urgência climática e a realidade económica

José Campos

Técnico Especialista, Direção de Indústria e Transição Energética, ADENE

20.05.2025

5

min. de leitura

Vivemos tempos de transformação acelerada, marcados por duas crises, climática e geopolítica, ambas exigindo uma resposta urgente e eficaz. Embora a transição energética – entendida como a substituição progressiva de combustíveis fósseis por fontes renováveis – seja debatida há vários anos, os seus verdadeiros alicerces e pontos de partida essenciais têm sido frequentemente negligenciados, aumentado a dificuldade na sua implementação.

Para uma transição energética bem-sucedida, esta deve ser inclusiva e iniciada nas nossas habitações através da alteração de hábitos de consumo, alteração de comportamentos e principalmente na análise da fatura de energia em cada mês, permitindo assim ao consumidor efetuar uma avaliação de como poderá substituir os combustíveis fosseis por energias verdes no seu dia a dia. No entanto, a pobreza energética e a iliteracia energética constituem ainda alguns dos maiores obstáculos a este processo. Segundo o Observatório Nacional da Pobreza Energética (ONPE), em 2024, aproximadamente 54% da população vivia em situação de iliteracia energética, enquanto 18% a 30% se encontra em pobreza energética. Estes números têm consequências práticas: cidadãos que desconhecem os benefícios de equipamentos eficientes, ou que, mesmo compreendendo-os, não dispõem de capacidade financeira para investir nestes, acabando inevitavelmente excluídos do processo de transição.

Num mundo de recursos limitados, a forma como utilizamos a energia é tão crucial quanto a sua origem. A eficiência energética destaca-se assim como o pilar mais imediato da transição, representando a forma mais rápida de reduzir o consumo de energia e as respetivas emissões de carbono, proporcionando poupanças significativas sem comprometer o conforto ou as funcionalidades dos serviços aplicáveis. Nas habitações, destaca-se como medida de transição energética a instalação de sistemas solares fotovoltaicos, por permitirem não só diminuir a fatura de eletricidade, mas também potenciar o aproveitamento da energia gerada, especialmente quando acompanhada da substituição de equipamentos a gás natural por alternativas elétricas e na eficiência energética através da reabilitação do parque edificado utilizando isolamentos nas fachadas e coberturas.  Acresce a substituição das janelas antigas por janelas com vidro duplo, que permitem reduzir as perdas e ganhos de calor resultando, assim, num maior conforto térmico, reduzindo o consumo de energia necessário para manter a habitação nas temperaturas adequadas.

Já no setor industrial, os benefícios da transição energética vão para além das poupanças diretas no consumo de energia, estendendo-se a toda a cadeia de valor, contribuindo para uma economia mais competitiva. Por exemplo, se uma indústria conseguir produzir o mesmo número de equipamentos com custos de energia mais baixos, reduz os custos de produção, o que pode traduzir-se em preços mais competitivos e, consequentemente, num aumento das vendas.

É inegável que atravessamos um contexto geopolítico atípico, o que nos tem obrigado a repensar a forma como produzimos e consumimos a energia, impulsionando a busca pela independência energética em relação ao exterior. Mas o que falta para conseguirmos atingir este objetivo? Para responder a esta questão é fundamental reconhecer que existem setores de atividade de difícil eletrificação, como a indústria do vidro e cerâmica, a aviação e o transporte marítimo, sendo um dos principais desafios a implementação de tecnologias alternativas para produção de combustíveis verdes, como o hidrogénio verde ou os biocombustíveis avançados, cujos custos ainda são elevados. De acordo com dados de 2023 do Observatório Europeu de Hidrogénio (Cost of hydrogen production | European Hydrogen Observatory) o custo para a produção de hidrogénio verde (5,77 €/kg) permanece significativamente acima dos custos de produção tradicional por reforma de metano a vapor com gás natural (3,4 €/kg). Esta diferença de preços torna o hidrogénio verde pouco atrativo para as indústrias que dependem deste vetor energético, dificultando a sua adoção em larga escala. Assim, para avançarmos rumo a uma maior independência energética, é crucial acelerar o desenvolvimento e a competitividade destas tecnologias, tornando-as mais acessíveis e viáveis para os setores mais difíceis de descarbonizar.

De uma forma resumida, a transição energética envolve vários fatores que devem ser ponderados “numa balança”, contudo o seu equilíbrio continua a favorecer a progressão, impulsionada sobretudo pela redução de custos de produção de energias limpas, pelo desenvolvimento de equipamentos mais eficientes e pelas poupanças significativas que estes proporcionam.

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Sobre o autor

José Campos, 27 anos, tem Mestrado Integrado em Engenharia da Energia e Ambiente.
É Técnico especialista na área de Transição Energética da Direção de Indústria e Transição Energética.

A ADENE é a agência nacional para a energia, com uma missão centrada nas pessoas e a ambição de reforçar o posicionamento de Portugal na descarbonização, é um parceiro ativo da transição energética, fortalecendo parcerias, dinamizando a política pública e estando mais próximo dos cidadãos. Com toda a energia!

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