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Ecodesign: quando eficiência energética e circularidade se cruzam

Ana Matos Almeida

Presidente da Direção, Circular Economy Portugal

14.07.2025

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Segundo um estudo recente publicado na Earth System Science Data e citado pelo The Guardian (19/06/2025), o orçamento global de carbono necessário para manter o aquecimento global abaixo dos 1,5 °C poderá esgotar-se em apenas dois anos, caso as emissões de CO₂ se mantenham ao ritmo atual. 2024 foi já o ano mais quente de sempre, impulsionado pelo aumento do uso de carvão e gás natural.

Perante esta realidade, cada fração de grau evitada representa menos impacto sobre pessoas e ecossistemas. O ecodesign surge como uma das soluções mais imediatas e eficazes para reduzir emissões de forma estrutural e, simultaneamente, aumentar a competitividade e a resiliência das empresas.

A União Europeia (UE) tem vindo a liderar esta abordagem desde 2009, com a Diretriz de Ecodesign (2009/125/CE). Em 2024, com a entrada em vigor do novo Regulamento Europeu de Ecodesign para Produtos Sustentáveis (ESPR), o enquadramento torna-se mais ambicioso: abrange praticamente todos os produtos comercializados na UE e impõe critérios de durabilidade, reparabilidade, atualizações de software, rastreabilidade e incorporação de materiais reciclados. Estima-se que estas medidas poderão evitar mais de 132 Mt de CO₂ por ano até 2030.

Na prática, começam a surgir produtos energéticos concebidos desde a origem para prolongar o seu ciclo de vida e facilitar a sua reutilização. Luminárias LED com drivers e módulos óticos substituíveis, já aplicadas em edifícios públicos e industriais, permitem manter o sistema em funcionamento sem substituições completas. Sistemas de climatização modulares — como as unidades VRF — possibilitam a atualização de componentes, reduzindo resíduos e custos de manutenção. No setor das baterias, fabricantes europeus estão a desenvolver modelos desmontáveis e rastreáveis, concebidos com princípios de design to repurpose, ou seja, pensados desde o início para serem reutilizados noutras funções — projetados para ter uma primeira vida em veículos elétricos e uma segunda vida em aplicações de armazenamento estacionário.

Facilitar a reparação é, aliás, um dos pilares do ecodesign. Em Portugal, a Circular Economy Portugal promove essa cultura com o Repair Café Lisboa, encontros mensais onde voluntários ajudam a reparar pequenos equipamentos, enquanto sensibilizam a comunidade para a importância de prolongar a vida útil dos produtos — um princípio cada vez mais relevante também para o setor empresarial.

Apesar do crescimento das energias renováveis, o aumento da procura continua a alimentar o consumo de combustíveis fósseis. Reduzir estruturalmente essa procura, com produtos e sistemas mais eficientes e circulares, é essencial para que as renováveis cumpram o seu verdadeiro potencial. O ecodesign e a circularidade não são apenas tendências: são ferramentas concretas para cortar emissões, poupar recursos, gerar valor e preparar as empresas para o futuro.

À medida que estas soluções ganham expressão, torna-se essencial medir o progresso. Ferramentas de avaliação da circularidade permitem identificar oportunidades, orientar decisões e comunicar resultados com rigor e transparência. Avaliar é um passo indispensável para evoluir.

Avaliar, repensar e agir é urgente. O melhor momento para começar é agora.

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Sobre o autor

Ana Matos Almeida é licenciada e mestre em Gestão pela Universidade Católica Portuguesa e pela ESCP Business School.
É atualmente presidente da direção da Circular Economy Portugal, associação que promove a transição para a economia circular no país, em colaboração com empresas, municípios e o público em geral, cargo que ocupa desde a sua eleição em abril de 2025.
Após concluir uma pós-graduação no Cambridge Institute for Sustainability Leadership, integrou em 2021 a TerraCycle em Londres – referência global em soluções de reciclagem e reutilização – onde liderou as áreas de Marketing, Comunicação, Parcerias e Crescimento Comercial.
Em 2016, participou no lançamento do programa corporativo de inovação social da Yunus Negócios Sociais no Brasil, mantendo desde então uma atividade regular de mentoria a startups de impacto.
Desde a adolescência que é movida por uma paixão pela sustentabilidade, quando integrou o núcleo jovem da Associação Portuguesa de Educação Ambiental (ASPEA). A sua carreira internacional passou por Genebra, Paris e Nova Iorque, onde contribuiu para o crescimento estratégico e sustentável de marcas de empresas como Procter & Gamble, Mondelez e Rémy Cointreau.

A ADENE é a agência nacional para a energia, com uma missão centrada nas pessoas e a ambição de reforçar o posicionamento de Portugal na descarbonização, é um parceiro ativo da transição energética, fortalecendo parcerias, dinamizando a política pública e estando mais próximo dos cidadãos. Com toda a energia!

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