Antes da Revolução Neolítica, iniciada no Crescente Fértil do Médio Oriente há cerca de 10000 anos e depois em outras regiões, o homem só tinha acesso à energia muscular ou somática, derivada da conversão da energia química armazenada nas plantas e animais consumidos na sua dieta, e ao fogo que disponibilizava energia térmica. Não se sabe ao certo quando o género Homo começou a usar o fogo, provavelmente há 2 a 1,7 milhões de anos. À medida que a agricultura se tornou mais eficiente e, portanto, capaz de produzir maior quantidade de alimentos, a população cresceu muito e a disponibilidade de energia aumentou consideravelmente. A construção das obras notáveis de grandes Civilizações da Antiguidade, como as pirâmides do Egipto, a Grande Muralha da China, e muitas outras na Ásia e na América Central, exigiram enormes quantidades de energia. Tal só foi possível graças ao grande número de pessoas envolvidas. Note-se que a energia mecânica fornecida por segundo pelo corpo humano quando realiza um esforço acentuado é apenas 100 W.
Veio depois a extraordinária Renascença que encheu a Europa, e especialmente a Itália, de obras de arte maravilhosas, que acolheu as experiências de Galileo Galilei, o nascimento da ciência moderna e a primeira globalização protagonizada inicialmente pelos navegadores Portugueses. Todos estes avanços civilizacionais deram-se antes da revolução industrial de meados do século XVIII. Para além da energia muscular, a humanidade tinha apenas acesso à energia térmica obtida na queima da madeira e a algum carvão, à energia cinética da água dos rios e ribeiros, que alimenta os moinhos de água, e à energia eólica que movimenta barcos à vela e moinhos de vento. Com a invenção da máquina a vapor por James Watt em 1769, e mais tarde de motores de combustão interna capazes de converter a energia química armazenada nos combustíveis fósseis – carvão, petróleo e gás natural – em energia mecânica, a humanidade entrou na nova era energética dos fósseis, em que o consumo de energia por pessoa aumentou espantosamente, sobretudo nos países industrializados. À escala global o consumo de energia primária aumentou de 20,3 EJ (exajoule = 1018 J) em 1800 para 589,7 EJ em 2021, ou seja, por um fator de 29 devido à acessibilidade dos combustíveis fósseis e a um modelo de crescimento baseado no uso intensivo de energia. Modelo de grande sucesso em termos do aumento da utilidade usufruída (definida e defendida por Jeremy Bentham e John Stuart Mill) ou, por outras palavras, do consumo crescente de bens e serviços por uma população também crescente. Efetivamente as características mais marcantes do período pós-industrial são o crescimento do PIB mundial, que de acordo com o Banco Mundial e o Maddison Data Project, cresceu de 1 bilião (1012) de dólares em 1800, para 126 biliões em 2021 (em dólares internacionais constantes de 2011), e o crescimento da população mundial, que cresceu de 990 milhões em 1800 para 7888 milhões em 2021.
A civilização baseada nos fósseis fez florescer a ciência e a tecnologia, melhorou muito a prosperidade económica e o bem-estar humano médio à escala global, especialmente nos últimos dois séculos, e aumentou as desigualdades entre países e no seu interior. Mas os fósseis têm um efeito colateral perigoso ao provocar uma mudança do clima global que se agrava. É necessário modernizar o modelo energético substituindo os fósseis por energias renováveis e por outras formas de energia descarbonizadas. É uma transição energética muito difícil à escala mundial, mas possível. É uma transição essencial para manter o vigor da nossa civilização, dos valores da solidariedade, da justiça intra e inter-geracional e da capacidade de fazer face aos novos desafios da sustentabilidade. Será possível realizá-la a tempo de evitar impactos muito gravosos, especialmente para os países mais frágeis e vulneráveis à insustentabilidade, num mundo cada vez mais fragmentado em blocos por conflitos e tensões geoestratégicas que se agravam? Temos de ter confiança e trabalhar para a ter.